Delicadamente, ela entra pela janela e se deita em minha cama. Como de costume, olho para o relógio e confirmo a pontualidade de minha ilustre visita. Ela nunca se atrasa e raramente esquece de trazer consigo os seus meros presentes.Em retribuição a sua generosidade, escrevo pequenos textos. A liberdade de escrever nunca me foi retirada, mas a inspiração brota apenas quando estou unida a ela. Ah, querida e fiel amiga que nunca me abandonou, inclusive neste momento, dedico essa prosa à responsável pelo meu desabrochar de pensamentos: à noite.
Minha ansiedade não a engana, infelizmente, pois por mais que eu deseje apenas abraçá-la em meu travesseiro e pedir bons sonhos, ela insiste em trazer à memória os fantasmas que me atormentam. Tenho consciência de que não sou a única com insônia no mundo, contudo contornei a sua magia e transformei-a a meu favor. Posso não entreter a quem se dispõem a ler. Posso não agradar a todos. Porém, esvazio um pouco do que me afoga.
Depois do crepúsculo, sinto um tanque se encher dentro de mim. O alarme foi acionado. Sem hesitar, a lua banha a cama e traz consigo a necessidade de chorar. Penso que a cada lágrima derramada é menos uma recordação a me sufocar. Contudo, nada escorre de minha alma. Ora, será que sequei? E o coração, sobrecarregado de tanto bater por quem almeja apenas dormir, extravasa. Transbordei-me inversamente.
A fim de saciar a necessidade de lacrimejar, exploro as oportunidades que a mesma me oferece. Sim, ela não proporciona somente horrores. Bifurcada, suas alternativas são como as raízes de uma árvore, que atingem comoventes dimensões. Porém, como filhos de Deus e agraciados pelo livre arbítrio, a tendência do homem é a escolha pelo caminho errado. Para mim, o certo ou o incorreto não existem. Existe o prazer. Sou movida por tudo que me faz bem, mesmo que momentaneamente, pois não se deve desprezar nenhum tipo de amor e muito menos de gozo.Enfim, jogo-me no que a noite tem a me dar. Esses são os melhores fins de dia, já que a mente é iludida pelas luzes, drinks e amores. Assim, não há depressão que se rende!
Logo, quando não há escolha, a noite me possui. Como hoje, sem alternativas para brincar de mágica, o limite do desespero se parece como uma cidade já visitada. O bolo de angústias persiste em não ser expelido. Na tentativa de gritar, abro a boca, mas nada dela sai. A cada piscar de olhos eu rezo ao tempo. Peço que o tormento logo acabe e que o sol invada o cômodo. Cansei de brincar de "Bridget Jones". Quero chorar!
Busco o motivo pelo qual não consigo realizar tal ação. Relembro as noites (insistente essa minha companhia...) que me entreguei por inteira. As memórias não são boas, porque comecei e nunca mais parei de lamentar. Creio estar em inércia. Tal qual busco a solução à frieza, determino o estado de ignorância ao meu ser. Afinal, não só a noite me acompanha, como também o medo. Medo de fofocar o que, aparentemente, se encontra adormecido.
Sendo assim, o que me resta? Sinceramente, a miopia não permite desvendar longínquas terras. Pobre de lágrimas e de espírito, contento-me com o caminho errado, o cigarro, a cerveja, as orações e o pôster de meu amado selado a cada choro não derramado, sufocando-me.